30 de maio de 2016

Em Memória de meu Amigo

Cada passo dado no tempo de nossa própria existência acrescenta um grão de memória tornando de nós aquilo que somos. Esta reunião involuntariamente colecionável dos momentos que vemos e sentimos, experimentamos, sofremos e nos alegramos, principalmente ao lado daqueles que passaram por nossa vida, molda-nos como uma estatueta de barro em busca da auto perfeição. Ao menos é assim que vejo a vida, as relações interpessoais, as recordações e seu infinito valor não apenas como pura nostalgia, mas como uma bússola que nos mostra de onde viemos, para onde devermos ir e o que precisamos valorizar. Gostaria de dedicar um desses momentos à compor um memorial especial ao meu amigo Graciliano Ricardo Trindade Sarmanho de Souza uma inesquecível amizade de minha adolescência que hoje, 30 de maio de 2016, estaria completando 34 anos. Todavia, apesar de ter ido prematuramente para os braços da eternidade, ele estará sempre vivendo nos corações daqueles que o amou, quer seja como pai, mãe, irmão ou amigo, pois a morte jamais prevalecerá enquanto houver lembranças e saudades.
“Lembrar é fácil para quem tem memória. Esquecer é difícil para quem tem coração.”

Não me recordo bem o ano muito menos o mês, possivelmente 1998. O clima se encontrava bem fechado durante aquela tarde, e embora eu gostasse demais da chuva, precisávamos apressar nossos passos sobre as calçadas irregulares da avenida João Paulo 2º (Na época conhecida por 1º de Dezembro) para finalmente chegarmos ao 1893, local onde funcionava a (hoje extinta) Sonic Games Locadora. Adentrando ao recinto, logo fomos arrumar as cadeiras, ligar o ar-condicionado, passar o pano úmido com água e desinfetante e espirrar o bom ar, tarefa cotidiana feita com prazer já que tínhamos algo especial marcado para aquela tarde. Enquanto esperávamos, eu procurava sentir o ambiente em sua totalidade, a temperatura climatizada na pele, o som dos ares-condicionados trabalhando a todo vapor e o aroma agradavelmente perfumado, um hábito que sempre procurei praticar. Não muito tempo depois, eles começaram a chegar um a um formando a turma da disputa de Mario Kart 64, são eles Clay, Denilson, Tiago, Vitor, Igor, Haroldo Jr., Fábio e Eu. Mas ainda faltava um, Graciliano que, por alguma razão e apesar de residir ao lado da locadora, as vezes se atrasava a esses encontros.
“A memória guardará tudo aquilo que valer a pena.”

Quando o víamos subir o não tão íngreme rampado cimentado dirigindo-se a entrada da locadora, logo alguns de nós dizíamos: “Até que em fim ele chegou!”. Em seguida, 4 pessoas eram selecionadas para a disputa de abertura, entretanto, muito embora fosse almejado o erguer da taça de ouro no pódio de fronte do castelo da princesa Peach, o doce gosto da vitória se resumia numa única coisa: Diversão. 
Como sempre a maioria de nós já tinha seu personagem favorito a ser escolhido, cada um com suas próprias características, enquanto uns eram mais velozes ou possuíam uma aceleração mais rápida, outros eram mais pesados e servia bem à jogadores agressivos, mas haviam aqueles que prefeririam os mais equilibrados.
A imagem acima mostra que Kamek, o Magikoopa vilão da série Yoshi, seria um dos personagens jogáveis, mas foi substituído por Donkey Kong na versão final

O domínio da planta da pista, assim como suas passagens secretas (Oficiais ou não), era outro fator imperativo para uma boa jogatina. Mas na primeira vez que joguei eu não conhecia as manhas das passagens secretas e por conta disso, por justamente seguir pela rota normal, eu ficava por ultimo enquanto todos pegavam os atalhos trapaceiros, o que me permitia um natural acesso as armas mais devastadoras como, por exemplo, as estrelas de invencibilidade, os raios com “efeito nanicolina”, e o famigerado maldito/milagroso casco azulado espinhoso que quando lançado na pista só sossegava quando atingia o primeiro colocado. Todavia, era interessante observar um estranho efeito causado nos demais jogadores e principalmente naqueles que ocupavam as melhores colocações enquanto o casco fazia seu zumbido característico, eles simplesmente engalfinhavam uma briga não mais pela primeira posição, mas pela segunda, quando finalmente o casco atingia seu alvo, dava gosto ouvir o meu amigo Graciliano deixando escapar a sua alta gargalhada que ecoava por todo aquele ambiente climatizado.
“Assim os últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos”

Interessante mencionar o casco azul, é que ele era uma novidade na época mesmo para aqueles que já eram experiente no Super Mario Kart do Super Nintendo, já que este casco surgiu pela primeira vez justamente no Mario Kart 64, e de acordo com o diretor do jogo, Hideki Konno, este foi criado para impedir que um líder habilidoso ficasse distante dos demais concorrentes. Mas qual a razão por eu estar falando desse game num memorial dedicado a um amigo? Simples! Mario Kart 64 foi jogo que mais jogávamos juntos.
“A amizade duplica as alegrias e divide as tristezas.”
Os nossos micro torneios criados naquele pequeno mundo imaginário de felicidade e, as vezes, escapismo, costumavam ser bem acirrados e calorosos. As nossas atenções não eram voltadas apenas a nossa atuação no game rodando na grande tela da TV dividida pelo game para 4 jogadores simultâneos, mas também observávamos o comportamento dos jogadores com o joystick nas mãos e as outras telas dos nossos adversários esperando o momento certo para desferir um ataque inteligente e cair na gargalhada tanto mediante a êxito quanto ao fracasso, e quando isso fosse causar princípios de escaramuças (Na verdade jamais passou disso), nossa vibração não passava de um discretíssimo indício de deleite travesso, até montávamos micros e silenciosas parceira relâmpago como um complô para pegar outro ou outros jogadores que estavam muito a frente de nós, e as pistas eram quase sempre cheias de cascos de tartarugas vagando em rumos erradicos atingindo os carros na pista.
A melhor maneira de começar uma amizade é com uma boa gargalhada.

Aquilo sim era diversão! Aliás, no manual da versão para Super Nintendo de Super Mario Kart, existe uma nota curiosa no que se refere olhar a tela do adversário. 
“Mantenha sempre um olho na tela do seu oponente”

Interessante não somente lembrar como também relatar que alguns traziam seu próprio Joystick ou cartão de memória (No caso do Playstation 1), mas outros jogavam com o que tinham somente pelo prazer de se divertir entre amigos mesmo a resposta do controle não sendo das melhores. Mas eu tento imaginar um universo paralelo em que certas coisas de ruim não tivesse acontecido com o meu amigo, e hoje ele estaria não apenas vivo, mas cem por cento bem de saúde e realizando todos os seus sonhos, fico imaginando como ele e os nossos demais amigos pensariam e falariam se vissem uma tela e dois player dividida em dois no sentido vertical visto que o normal é ela se dividir no sentido horizontal. Infelizmente não tive a chance de mostrar isso a ele.
“Quando defendemos os nossos amigos, justificamos a nossa amizade.”

Ou quem sabe como ficaria o nível de nossas disputas se as telas ficassem de cabeça para baixo... Eu lembro com máximo detalhe as gargalhadas dele, e por isso imagino todos nós jogando assim.
“A amizade não se busca, não se sonha, não se deseja; ela exerce-se (é uma virtude).”

Não! Diferente do de costume, hoje eu não ensinarei a fazer essas e outras coisas, isso fica para outra ocasião. Mas na época não podíamos provocar reações assim nos games, não que fossem impossíveis, mas porque não havia recursos para rastrear tais coisas. Entretanto, adoraria que ele estivesse agora aqui conosco para testemunhar novas formas de gameplay em games antigos. Apesar disso tudo, boas lembranças é o que não faltam e, com certeza, segundo meu próprio amigo que hoje não esta entre nós, sua infância foi muito feliz, e me sinto honrado e igualmente feliz por ter feito parte da história desta grande e marcante figura. Lembro que quando criei a minha conta no Face ele foi uma das pessoas que mais queria reencontrar. Não foi difícil, muito embora tenha levado um tempo para acha-lo. Foi uma felicidade tremenda, ainda mais porque ele se recordava de mim. Conversamos por um bom tempo, mas não o bastante visto que ele estava em um tipo de tratamento que somente depois eu vim entender o que se tratava. Após isso, ainda curti vários de seus posts voltados a culinária, e poucas vezes lhe enviei links de coisas loucas que eu fazia nos games.
“Nenhum gesto de amizade, por muito insignificante que seja, é desperdiçado.”

Porém, não tinha ideia do mal que lhe havia atingido obrigando a travar uma luta árdua pela própria vida, batalha esta que durou anos e que, em conformidade com a opinião deste que vos escreve agora, tornou dele nada mais nada menos que um herói por jamais desistir ou perder seu sorriso. Porém, num fatídico dia de março, mais precisamente na sexta feira santa de 2016 recebi a notícia de um amigo e deparei-me com um post de sua irmã Giovanna Souza que me trouxe uma tristeza tão inesperada que eu simplesmente não sabia o que pensar. Foi difícil crer e aceitar que aquela pessoa tão cheia de vida e que emanava uma atmosfera tão grande de bem estar que nos inundava sempre os corações quando diante de sua presença,  meu amigo, havia nos deixado. Mas sua guerra jamais será dada como perdida, sua luta o fez sim permear num mundo desconhecido obrigando-o a encara um ameaçador poder sinistro tão mortal quanto os perigosos monstros nascidos das mentes dos grandes escritores literários, ou dos jogos que por quase infinitas vezes nos aventurávamos. Todavia ele jamais se entregou, seu bom humor e sua vontade de viver faz de meu amigo mais do que um vencedor. A ele, Graciliano Ricardo Trindade Sarmanho de Souza, nascido no dia 30 de maio de 1982, apaixonado por Culinária Vegana, Cinema, Seriados, Beleza, Livros, HQs, Rock N Roll e Games, dedico meus sinceros sentimentos a seus familiares neste humilde memorial. Ao meu amigo que agora deve estar desvendando os infinitos mistérios da vida, do universo e tudo mais, deixo a minha mensagem: Você agora esta livre de todas as dores e angustia, e um dia nos encontraremos na eternidade para relembrar os bons momentos e rirmos muito, rirmos como jamais fizemos juntos. Descanse em completa e perfeita paz.
Belíssima dedicatória criada por sua amiga Julie Cristina‎
Boas recordações, Via Longa e Próspera à todos...
\\//_

10 comentários:

  1. Respostas
    1. Muito obrigado, o seu vídeo ficou excelente também! Vou dar uma força na divulgação...

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  2. Cara, muito bom esse post. Confesso que eu me emocionei com ele. O texto me fez pensar nos meus amigos que foram muito importantes na minha infância e que eu perdi o contato ou simplesmente não converso com eles devido à distância e a falta de tempo. A boa amizade deve realmente ser cultivada, porque existem amigos mais chegados que irmãos.

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    1. Isso mesmo! O mais chato nessa história é que o Graciliano não foi o único amigo gamístico que eu perdi...

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  3. Cara, muito bom esse post. Confesso que eu me emocionei com ele. O texto me fez pensar nos meus amigos que foram muito importantes na minha infância e que eu perdi o contato ou simplesmente não converso com eles devido à distância e a falta de tempo. A boa amizade deve realmente ser cultivada, porque existem amigos mais chegados que irmãos.

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  4. Poxa, meus sentimentos a todos amigos e familiares do Graciliano, é muito triste quando perdemos alguém, ainda mais alguém de bem, ainda mais alguém que lutou contra algum tipo de problema de saúde, ainda mais quando o fez com sorriso no rosto o máximo que pôde. Dizem que os bons nos deixam mais cedo, cada vez mais eu acredito que isso é verdade, embora não consiga encontrar nenhuma lógica nisso.
    Enfim, obrigado por compartilhar este memorial conosco, belíssima homenagem. Esse tipo de nostalgia mantém a pessoa de certa forma eternizada neste mundo.

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    1. Muito bacana isso que você escreveu, e eu que fico agradecido sempre por sua presença por aqui.

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