Antes de começar com as postagens propriamente ditas, achei que valeria a pena explicar o porquê dessa coluna existir, quais são meus objetivos com ela e se ela poderá ser ou não interessante para vocês.
Em minhas pesquisas sobre jogos em geral (e videogames mais especificamente) cheguei à conclusão de que, embora qualquer arte possa ser chamada de jogo, o contrário não é verdadeiro por definição. Mas, antes que me joguem pedras, vou explicar meu raciocínio mais abaixo.
Durante a Idade Média, a palavra latina "ars" ("arte") traduzia o termo "tekhne" ("técnica") do grego sendo, portanto, intercambiáveis entre si referindo-se a qualquer conhecimento orientado à produção. Tínhamos, por exemplo, as sete artes liberais além das artes do belo. Na Renascença, estas "belas artes" começaram sofrer uma série de mudanças interessantes e das quais não tratarei aqui por uma questão de concisão. Basta saber que, quando alcançamos o século XIX, a palavra "arte" passou a significar com o filósofo Hegel a mesma coisa que "belas artes".
Ou seja, somente então que a palavra "arte" passou a ter o sentido que utilizamos hoje em dia: uma produção especificamente orientada ao belo (pintura, escultura, música etc.). Antes, o artista era chamado simplesmente de artesão e apenas se diferenciava de outros artesão pelo tipo de produto que construía.
Atualmente muitas coisas são chamadas de arte numa espécie de eufemismo, ou por exaltação do sublime em algo, ou da alta habilidade de seu executor. Por exemplo, dizemos "arte da tapeçaria" hoje não pensando na habilidade técnica do artesão em produzir coisas belas, mas por criar algo que nos deixa maravilhados e nos causa algum tipo de êxtase diante dessa sua obra.
Com jogos, a mesma coisa acontece. Podemos dizer que um jogador de futebol domina muito bem sua arte. Ou ainda que determinado corredor de Fórmula 1 era um artista. E, claro, podemos também dizer que um jogo de videogame é arte. Tudo que nos encanta e nos retira temporariamente do mundo, hoje, costuma ser chamado por nós de "obra de arte", ou simplesmente "arte".
No caso de jogos a coisa se complica um pouco mais. Esse "sair temporariamente do mundo" que acontece quando entramos (e sem metáforas aqui) no mundo que o jogo nos propõe, acontece também na arte. Um filósofo francês do século passado já dizia que "cada quadro é um mundo". E, com isso, ele queria dizer que realmente visitamos um outro mundo quando realmente nos deixamos levar e seduzir por uma obra de arte qualquer. E esse "se deixar levar" é a definição básica de jogo.
Mas, como vimos, embora seja de certo modo essencial à bela arte que saíamos de nosso mundo para entrarmos no mundo da obra, essa não é uma característica sua enquanto arte, mas enquanto jogo. Afinal, a produção de obras de arte orientadas ao belo é inútil do ponto de vista pragmático. Ou seja, um quadro não nos "serve" da mesma forma que a cadeira de um carpinteiro, ou a casa de um construtor civil. A arte é definida pela seu conhecimento voltado à produção real de uma ideia diretriz inicial, seja ela qual for. A bela arte é uma arte que produz o belo por ter a característica de não se importar com o utilitário; e essa é uma característica do jogo.
"Quer dizer então, Thiago, que não há arte em jogos de videogame?" Não foi isso que quis dizer. É plenamente possível que tenhamos experiências estéticas quando jogamos um jogo. Por exemplo, ao jogarmos xadrez com peças detalhadas de vidro, podemos perder um bom tempo de nossos turnos observando as belas minúcias da Rainha, ou do Bispo. Porém, ao fazermos isso, saímos do mundo de jogo Xadrez e entramos num jogo dentro dele: entramos no jogo da arte que é uma outra experiência lúdica (e estética neste caso).
Muito confuso? Vamos usar um exemplo com jogos de videogame para ficar mais claro. Inclusive é um exemplo que certamente explorarei em algum momento mais adiante e que utilizei em um artigo acadêmico ainda não publicado.
Quando eu era criança e jogava Sonic the Hedgehog para Mega Drive, eu era fascinado pela música da Star Light Zone. Muitas vezes eu ligava o console somente para chegar até ela e ficar admirando aquele céu estrelado curtindo aquela faixa que é uma das melhores que já ouvi em um jogo de videogame até hoje.
Nesse exemplo, quando eu chegava na Star Light Zone, deixava de jogar Sonic para jogar uma outra coisa que ele me oferecia: o jogo da arte musical daquele cenário. Derrotar Robotnik, chegar ao final do Ato, coletar argolas etc. não me importava mais. O que me importava era prestar atenção na música e me deixar levar por ela.
Portanto, existem mundos possíveis dentro dos mundos de jogos que tanto apreciamos. Esses mundos podem ser orientados à arte, mas isso não torna o mundo que os originou em arte por definição. É como se nós "retiramos" esse mundo estético do mundo de jogo por assim dizer.
E é tratar disso que pretendo nessa coluna e em sintonia com a proposta mesma do site: trazer à luz experiências estéticas em jogos de videogame. E isso, de certa maneira, também é uma espécie de desconstrução. Falaremos aqui de músicas, cenários e quaisquer outras obras de arte que apareçam nos jogos de que trataremos aqui. Vai ser uma viagem interessante eu acho. E encorajo fortemente o espaço dos comentários: não estou aqui só para mostrar coisas, mas para conversarmos a respeito delas. Todo jogo e toda bela arte requer e exige esse espaço comunitário afinal de contas.
Bem, falei mais do que havia planejado para uma primeira coluna. Espero que não fujam dela a partir de agora!
Até a próxima postagem!
Se tem algo que eu penso em relação aos Video Games (Eu poderia usar o termo Jogos, mas prefiro especificar melhor), é que além de ser uma arte clara e definida por si só, ele faz a junção perfeita e harmoniosa, se assim quiser/realiza a equipe humana, das mais diversificadas forma de expressão artística ou profissional.
ResponderExcluirPor exemplo, trabalha com a música (Som), a qual alguns devem reconhecer pela numeração da ordem das artes como sendo a primeira delas, e não se trata apenas de uma realização da harmonia da composição, mas fazer isso relevando as limitações.
Trabalha com cor em seus cenários combinados com arquitetura (Imagine uma pessoa sem noção engenharia, arquitetura ou mesmo o básico de desenho projetando um cenário?), a atuação dos personagens que apela pro Teatro (5ª Arte) e, trazendo para os dias de hoje, para uma direção cinematográfica (7ª Arte), e nem falei sobre a arte de escrever onde alguns jogos são uma verdadeira arte literária (6ª Arte).
Claro que outras obras de artes também integram em si outras formas de expressão do pensar e sonhar, mas qual delas integram elas melhormente?
;-)
Nem vou me estender aqui sobre essa integração, mas convido qualquer pessoa a pesquisar sobre isso, a estudar e se inteirar. A minha vida profissional já foi palco de debates fervorosos sobre isso, mas a de residir na ignorância aquele que ainda interpreta Video-Games como apenas jogos.
Excelente texto, Thiago. Parabéns!
Valeu mesmo pela força, Yoz! Essa sua perspectiva é a mais comum nos estudos de jogos de videogame hoje na área de comunicação. É interessante de toda maneira. :-)
ExcluirEntendo como é a sensação de parar numa fase, e ficar lá só apreciando a trilha sonora.
ResponderExcluirFazia muito isso no NINJA GAIDEN 2 na fase que aparece aos 06:54 do seguinte vídeo:
https://www.youtube.com/watch?v=Rzb4Tonx0WI
Castlevania do NES então?Nem se fala.
Eu queria saber desenhar para fazer um quadro "a lá 8 bits" e botar na parede do meu quarto.
Seria minha obra de arte.
Bons exemplos que deu cara! Adorei! :-D
ExcluirUm quadro com essa estética para pendurar na parede seria ótimo! Eu faria o mesmo. ;-)
Há 15 anos atrás, quando comecei a colecionar videogames, com a minha descoberta de Sonic The Hedgehog no Master System, eu amava, amava mesmo, parar a ação para desenhar os cenários fundo. Green Hiil, The Bridge, Scrap Brain, The Labirinth eram meus favoritos! Fora avançar até Scrap Brain só para ficar ouvindo a música. Tentava, também, andar com o Sonic alguns passinhos e ir pausando a cada movimento para, eu nem sabia o que isso era na época, capturar sua animação quadro-a-quadro, e tentava, depois, desenhar e bloquinhos para reproduzir em "desenho animado".
ResponderExcluirEm 2001 organizei uma lista, escrita em caderno, das minhas músicas favoritas de videogame, que eu iria gravar de algum jeito para ouvir no rádio ou computador. Eram algumas de Donkey Kong Country 2: Diddy Kong Quest, Speedy Gonzales in Los Gatos Bandidos, Megaman X, Need For Speed 2, Fantasy Zone II - The Tears Of Opa-Opa, Lord Of The Sword, Sonic The Hedgehog, Top Gear, Jogos de Verão, Alex Kidd in Shinobi World... E tantas outras que preciso encontrar o caderno, que tenho até hoje, para consultar, kkkk.
Pouco depois disso veio a maior revolução em videogame da minha vida: conheci Sonic Adventure. Aí a trilha sonora se tornou a minha favorita. No ano seguinte, quando conheci Sonic Adventure 2, minha paixão foi tamanha que fazia de tudo para tentar encontrar as músicas no Kazaa em na casa de algum amigo, já que eu não tinha internet em casa. Essa paixão por esta trilha sonora perdura até hoje. Tanto que há uns 05 anos adquiri o álbum duplo oficial de Sonic Adventure 2. =D
Além da parte de trilha sonora, eu sempre prestei muita atenção aos detalhes em geral dos jogos. Já notou o quanto é bonito o cenário do segundo mundo de Speedy Gonzales? Fora que eu pauso até hoje Top Gear 3000 para ficar admirando os inalcançáveis cenários de fundo, com suas paisagens alienígenas criativas e bem desenhadas. Parecem quadros de tão bonitos! O mesmo eu faço com Sonic Adventure. Eu me impressiono com as belezas dos cenários deste game até hoje. Já joguei incontáveis vezes, já terminei o jogo outras tantas, mas ainda sinto o mesmo arrepio e palpitada de euforia quando jogo hoje!
Outro game, este recente, que me impressiona com os cenários, a ponto de eu parar e ficar criando trilhas sonoras com alguns clássicos do Rock, é Minecraft. Seus cenários surreais meu empolgam!
Enfim, não vou me prolongar mais aqui senão o texto vai ficar muito grande e o Yoz vai me chamar atenção, kkkkkkk.
Mas me identifiquei imediatamente com seu relato quando joga Sonic. Na época em que comecei a fazer isso, pensei que eu era o único "louco" que via os jogos desta forma, até mesmo porque todos os meus amigos só queriam saber de zerar o jogo, descartar e passar para o próximo.
Eu considero videogame a arte perfeita. Não sou entendido do assunto, mas sei o que sinto quando jogo videogame. E concordo 100% com o amigo Yoz quando diz que videogame é a união de todas as 7 belas artes.
Parabéns pelo texto! Ansioso para ver o próximo!
Que nada! Pode escrever a vontade! Sobre o Speedy Gonzales, estou devendo uma solicitação sua, né? Bora ver se isso sai!
ExcluirValeu mesmo pela força cara! :-D
ExcluirE pode escrever bastante que eu gosto de ler! hahahaha Muitos dos jogos que citou fizeram parte (e ainda fazem) da minha experiência. Muitas músicas e cenários memoráveis sem sombra de dúvidas! Também ouvi muito as OSTs de Sonic Adventure 1 e 2 antes mesmo de jogar os games inclusive. hahahaha
E a trilha do Sonic 1 do Master System é linda de morrer. hehehe A da Bridge Zone é uma das que mais curto também: dava uma dó porque a tela ficava correndo sozinha nos apressando a terminar logo o cenário. XD hahahahahaha
acho que de todas ate hj não nada que se compare a victory fanfare a cada FF uma melodia completamente diferente e igual, quantas vezes eu parava a batalha e fica hipnotizado com a musica, ou na A caverna da Fenix do FF6 que vc para e fica curtindo a musica de fundo
ResponderExcluirFinal Fantasy VI tem músicas bem marcantes mesmo! Eu gosto da que toca quando combatemos o Kefka na batalha final, daquela meio tribal que toca no Veldt e muitas outras! ^_^
ExcluirSe você quer falar de arte em jogos de videogame então tem que falar da arte de Monster Monpiece e Moe Chronicle. Aquiles sim são exemplos de arte infundida em jogos, uma vez que foram contratados mais de 50 artistas diferentes para desenhar a representação de criaturas mitológicas como personagens humanóides.
ResponderExcluirPesquisei aqui e parece muito moe para meu gosto. XD hahahahaha
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